Depoimento Jaime Kemp

Parte de um depoimento dado a Erica Campos Vicentini da Luz, no dia 12 de Fevereiro de 1998.

Para começar, gostaria de me apresentar: Meu nome Jim Warren Kemp, nasci no Estado de Míchigan Estados Unidos da América, em uma família muito pobre. Sempre falo que nasci na mesma cama em que fui concebido, porque meus pais não tinham dinheiro para ir a um hospital. Com 4 anos de Idade, mudamos para a Califórnia porque papai estava procurando um emprego melhor, e praticamente fui criado lá. Aos 18 anos fui para a grande cidade de Los Angeles, para cursar a universidade – Estudei Ciências Gerais.

Depois de cinco anos, mudei para o Estado de Oregon onde fiz mestrado em teologia – porque Deus já havia me chamado para ser missionário. Continuei meus estudos e recebi da mesma Universidade do Sul da Califórnia, o Doutorado.

Encontrei minha esposa, Judith, quando ela estava se formando na Universidade de Portland, em enfermagem e eu estava no segundo ano da faculdade. Nós começamos a namorar e, faltando um ano para minha formatura, nos casamos.

Um ano depois viemos de Navio para o Brasil. Estamos no Brasil desde 1967, portanto quase todo nosso casamento é vivido aqui. Nós temos três lindas meninas, brasileirinhas, todas filhas adotivas, são lindas: duas morenas de olhos escuros e uma loirinha dos olhos verdes. Melinda Joy (joy porque foi alegria para nós a sua chegada) é nossa paranaense, nasceu em Londrina, e nos presenteou com nosso primeiro neto James Paul – ele é lindo, lindo, lindo é claro! Márcia Adriana, nossa Segunda filha, nasceu em São Paulo, no interior do Estado, a terceira é Anne, é a nossa gaúchinha, nasceu perto de Ijuí, no interior do Rio Grande do Sul, é a nossa loirinha. Anne cursou a mesma faculdade que me formei.

Muita coisa de meu ministério é resultado da minha família, dos problemas pelos quais passei. Veja minha história: sou fruto do terceiro casamento de mamãe, ela se casou quatro vezes, no momento, temos 11 divórcios na família, uma família tremendamente problemática. Mas através disso Deus tem falado ao meu coração e tem me preparado para todo esse ministério que faço hoje.

Durante os anos em que eu estive à frente de Vencedores Por Cristo, tive a oportunidade de viajar pelo país inteiro e ver a tremenda necessidade de trabalhar em prol da família. Quando em 1977 entregamos Vencedores Por Cristo para a liderança brasileira, nos mudamos para Curitiba e começamos a desenvolver o Ministério Lar Cristão e estamos até hoje envolvidos nesse trabalho.

Já no primeiro ano de faculdade 1959 – Deus me chamou para ser um missionário. Nunca havia pensado nisto, mas desde então eu tenho vivido, comido, sonhado, bebido Missões e tudo que envolve Missões.

Éramos representantes do evangelista Billy Graham, quando eu e mais alguns colegas chegamos ao Brasil em 1966/67, e vimos a necessidade de trabalhar com a igreja no discipulado.

A igreja brasileira já estava evangelizando muito, mas não estava conseguindo manter os frutos e fazê-los verdadeiros discípulos.

Então, deixamos de trabalhar com a Associação Billy Graham no Brasil, e começamos a desenvolver junto a Sepal um trabalho de discipulado, desafiando pastores e líderes para este ministério.

Foi então que começamos a pensar, planejar um ministério que naquela época nem sabíamos como chamar.

Chamamos então de Projeto #7. Por que?

Porque já haviam se passado seis projetos, isto é quando eu estava na Universidade, levei jovens para o México, para lugares rurais no Sul dos Estados Unidos, lugares simples, de gente pobre. Treinamos equipes para trabalhar, ministrar, evangelizar, ensinar a Palavra nas montanhas de Tenesse, Kentucky e também Oregan, Washington, Nevada e Califórnia. Saímos durante os verões, nos meses de junho-julho-agosto, com estudantes de segundo grau e universitários.

Estávamos numa época de aprendizagem e usamos algumas estratégias para poder formar realmente uma equipe e discipular pessoas.

Uma ocasião viajamos de ônibus de Los Angeles para Kentucky, três a quatro dias de viagem. Paramos no Grand Canyon – que é um espetáculo, colocamos mochilas nas costas e descemos até o fundo do vale.

Ficamos vários dias assim, acampando juntos, conhecendo uns aos outros, orando juntos, compartilhando a vida. Isso criou um tremendo senso de equipe, que quando chegamos em Kentucky já estávamos preparados para ministrarmos juntos.

Foram seis verões assim antes de chegar ao Brasil já com esta visão de formar um Ministério semelhante.

Quando chegamos aqui, logo percebemos que os brasileiros gostavam muito de música, e que um meio de comunicar o Evangelho seria através de equipes musicais.

Começamos a sonhar, a ver as possibilidades de reunir grupos de 10, 12, 15 pessoas, com o propósito não só de cantar e evangelizar, mas receberem um treinamento, discipulado, sedimentar a fé, principalmente com a juventude.

Eu sempre tive um amor especial pela música. Também estudei música na Universidade como uma Segunda matéria, por isso demorei um ano a mais para me formar.

Estudei violão e estudei acordeão. Mas, quando cheguei ao Brasil, percebi que o brasileiro tinha tanta capacidade musical, especialmente com o violão (parecia que todo mundo tocava violão !). que eu não falava absolutamente nada, porque certamente iriam pedir que eu tocasse e eu não poderia tocar tão bem quanto os meus companheiros, e muito menos ritmos brasileiros.

Mas, eu sei que Deus tinha outras área para mim em ensino, que é meu Dom espiritual e que eu tenho exercido isso grandemente no país e estou alegre com a possibilidade de fazer isso.

Quando a equipe para a primeira viagem estava em treinamento, numa das reuniões, escrevemos vários nomes num quadro negro. Vem à minha memória aqueles jovens sentados no chão e a gente discutindo que nome melhor representaria o grupo. Não me lembro agora dos nomes, mas chegamos à conclusão que Vencedores Por Cristo era a melhor sugestão. O Emblema de Vencedores Por Cristo, que é aquela planta que sai da Bíblia, representa a ideia que através do Ministério Vencedores Por Cristo pessoas possam crescer na sua vida, na comunicação do evangelho.

A SEPAL sempre teve a norma que todos missionários deveriam ser membros de uma igreja brasileira e atuar, na medida do possível, naquela igreja. Apesar de ser batista, comecei a frequentar a Igreja Presbiteriana de Santo Amaro, onde era pastor naquela época Pr. Jacó Silva. Então, foi assim que começamos a recrutar os primeiros jovens: presbiterianos, depois alguns batistas, metodistas, até que foi se expandindo e pessoas de outras igrejas de São Paulo se juntaram ao grupo, até começarem a vir pessoas de outras cidades, não somente brasileiros.

Tivemos muitos jovens americanos que vieram dos Estados Unidos. Em outubro de 1967, começamos os preparativos para a primeira equipe: os primeiros contatos com as igrejas, o recrutamento de jovens, o treinamento, em julho de 1968 saímos para nossa primeira viagem.

Por causa do nosso compromisso com a igreja local, nunca escolhemos um jovem que não tivesse o aval, a permissão do pastor.

Fizemos uma carta que devia ser assinada pelo pastor, dando permissão de “emprestar” seu jovem durante o período de treinamento e viagem.

Também os jovens tinham que preencher um formulário, no qual falava sobre sua experiência com Jesus, sobre seu conhecimento da Palavra de Deus, um testemunho da sua fé e também, a permissão dos seus país. Nós não queríamos pegar um jovem que fosse recém convertido, mas algum jovem que tivesse alguma experiência, que trabalhasse na sua igreja local, e fosse envolvido com o Reino de Deus.

A parte musical não era o principal. A ênfase era “vida”, caráter, discipulado, testemunho, essas coisas. Mais tarde, começamos a escolher pessoas que tivessem capacidade de cantar e, então, além de todos esses requisitos de vida cristã, tinham que fazer um teste para ver se podiam cantar ou não.

Cada jovem tinha que levantar o seu sustento, como um missionário.

Muitos achavam que não daria certo, em outras palavras, diziam: Ah, Jaime, você nunca vai conseguir recrutar um jovem que tenha que pagar para ministrar a Palavra do Senhor”. Errado. Nós conseguimos. Nós estabelecemos uma quantia e cada jovem tinha que levantar o necessário através dos amigos, igreja, tio, pai, ou quem quer que fosse, exercitando sua fé para conseguir o dinheiro.

Muitas igrejas mandavam seus jovens como missionários mesmos. Nós tivemos reuniões em que os jovens ajoelharam-se na frente da igreja e o pastor e os presbíteros impondo as mãos, enviaram-nos para o campo.

Também tinha pastor que dizia: Ah, Jaime, esquece esse negócio porque não vai dar certo. Qual é o pai que vai deixar sua filhinha de 18 anos de idade sair com um grupo de jovens viajando pelo Brasil, mesmo tendo pastor supervisionando?” Errado.

Deus tocou nos corações e se no inicio foi difícil “vender o peixe”, quando começaram a ver a benção da música, do testemunho, da salvação de almas, então, começaram a ver, a reconhecer que era uma obra séria e os pastores até diziam: “ Olha, você pode ter dois dos meus jovens, ou três na próxima equipe?, a igreja vai sustentar…”

Aos poucos nós conseguimos ganhar credibilidade com os pais, com os pastores, com a igreja em geral, para que a juventude pudesse participar conosco. Naquela época a gente tinha que correr atrás. Foi difícil arranjar as pessoas, algum tempo depois tínhamos fila de espera.

Ary Veloso, meu colega de Sepal, tinha muitos contatos em Minas Gerais, daí a 1ª equipe ter se dirigido para aquela região. Ele perguntava se não estariam interessados em receber um grupo de jovens que cantavam e davam testemunhos, etc, e com o passar do tempo, os pastores ligavam e requisitavam a visita de uma equipe à sua cidade.

Para organizar as programações, fazíamos algumas sugestões, preparávamos um guia de como montar um trabalho, mas também deixávamos o pessoal livre para usar as oportunidades que surgissem.

As igrejas, vendo a oportunidade de ter o conjunto na sua cidade, acabavam sugando a gente ao máximo: eu me lembro de um Domingo em que fizemos oito programas: começamos as 6h30 da manhã em um programa de rádio e terminamos à noite na igreja central da cidade. A equipe quase morreu de cansaço.

Estudos bíblicos que eram dados no treinamento como “ Membros uns dos outros”, que fala sobre a nossa responsabilidade como irmão de orarmos uns pelos outros, amarmos uns aos outros, servirmos uns aos outros.

Eram a base de preparação, criando uma unidade, um senso de equipe, um sentido de carinho, amor, tanto que quando cantávamos pela última vez desfazendo a equipe, era uma choradeira o pessoal chorava como criança. Deus criava um sentido de equipe, de carinho entre nós, que muitos jovens não tinham na sua própria igreja, muitos nem na sua própria casa, e naquela equipe isso acontecia. Isso foi uma benção.

Sempre procurávamos, momentos de oração, de compartilhar, de abrir o coração, criar realmente este sentido de equipe em todas as turmas que viajavam conosco.

Já para a primeira viagem, gravamos um disquinho com quatro músicas, duas de cada lado. Haroldo Reimer, diretor do Instituto Bíblico Palavra da Vida, foi quem nos ajudou na gravação, por já ter experiência nessa área. Nós gravamos o primeiro disco lá nos Estúdios da Gazeta, na Av. Paulista. Nessa mesma gravadora gravamos os quatro disquinhos seguintes e o nosso primeiro Long Play: Fale do Amor. Todos foram sucesso, porque quase não havia nada para a juventude evangélica.

Na 3ª equipe de Vencedores Por Cristo começamos a mudar o ritmo, começamos a envolver mais ritmos brasileiros.

Talvez o primeiro sambinha que cantamos foi do Wolô : Antes mesmo que eu fosse alguém… a partir daí, demos maior espaço para a música brasileira, não abandonando a música que vinha dos Estados Unidos, Europa mas expressando nosso testemunho mais na língua brasileira.

Alguns fatos não vou me esquecer, quando nós entramos com a bateria na igreja. Isso já foi pecado sem perdão!

Uma vez em que cantamos na Catedral Presbiteriana Independente, na Rua Nestor Pestana, em São Paulo, em um Domingo pela manhã em que a igreja estava superlotada, tinham duas senhoras idosas no primeiro banco da igreja, a bateria estava na frente delas e o Sérgio Leoto era quem iria tocar. Então disse a ele que não batesse muito forte, porque a acústica da Catedral iria repercutir e ampliar muito o som.

Mas na primeira descida de braço, aquele ruído tão estranho para as duas senhoras, fez com que pulassem a quase três metros do banco.

Também fomos criticados pelos ritmos, chamavam de “música do diabo”. Agora não é mais “musica do diabo”, mas naquela época a bateria era um “instrumento do diabo”, a guitarra elétrica era um “instrumento do diabo”, só o violão, piano, músicas suaves em algumas igrejas.

Por um outro lado, algumas igrejas com uma visão diferente nos aceitavam com a maior alegria e até batíamos palmas, usávamos os instrumentos ritmados e tudo mais.

Fomos os pioneiros no uso da guitarra elétrica, baixo elétrico, piano, pandeiro – que às vezes era um escândalo para os irmãos. Trouxemos essas músicas, esses instrumento de ritmo para dentro da igreja.

Também treinei o conjunto a colocar um pouquinho de balanço no próprio corpo, nada indecente, nada sensual, dentro do ritmo da música, às vezes batendo palmas, às vezes movimentando o corpo.

Hoje em dia nós temos a coreografia que está invadindo a igreja, mas naquela época sofremos muito.

Como estratégia, usamos muitas músicas folclóricas. “Uirapuru” foi uma das que mais cantávamos em escolas, em praças, em alguns lugares públicos para atrair pessoas.

Começávamos cantando músicas folclóricas e quando juntávamos um grupo partíamos para um programa evangelístico.

Mas usamos as músicas folclóricas também para mostrar que os evangélicos podiam cantar alguma coisa além de música sacra ou canções evangélicas, ou como queiram chamar.

No treinamento das equipes, procurávamos discutir sobre tudo. Inclusive minha esposa nas equipes ensinava uma matéria chamada Boas Maneiras onde falávamos para os rapazes e moças sobre os cuidados e respeito ao próximo e com a casa que iria ficar hospedado.

Nós instruíamos sobre tudo quanto é coisa, até escovar dente, engraxar sapato, tomar banho, um montão de coisas que às vezes exigiam uma orientação também.

Eu me lembro de algumas equipes onde tinha o “Capitão da Hora”. Nós marcávamos hora para estar no ônibus, ou em determinado lugar.

Se você passava um minuto, você pagava uma multa, cinco minutos outra multa, e o Capitão era o responsável pelo controle. Isso era para tentar criar um senso de pontualidade. Nossa agenda era cheia e nossos horário eram apertados. Procuramos dividir as responsabilidades durante as viagens, então, além do “Capitão da Hora”, tinha o “ Líder Espiritual “ que dava os estudos bíblicos e/ou que coordenava o estudo bíblico na equipe, tinha a pessoa que cuidava do material, microfone, equipamentos de som etc.

Cada um tinha sua responsabilidade na equipe. Tudo isso porque muitos jovens vinham de lares onde não havia um ensino e divisão de responsabilidades: mamãe fazia tudo, ou a empregada pegava até a roupa suja. Agora eles tinham que lavar roupa, passar roupa etc.

Durante as viagens, nos carros ou ônibus, aproveitávamos o tempo para ler a Bíblia ou livros sobre assuntos pertinentes; para discutir sobre tradições da igreja evangélica que atrapalhavam o andamento do Evangelho, a salvação de almas, e também assuntos da equipe: quem vai dar testemunho, que músicas vamos cantar, o que precisamos corrigir etc.

E tantas outras coisas poderia dizer… Deus usou Vencedores Por Cristo para literalmente mudar a face do louvor neste país e incentivarmos muito conjuntos musicais, fico grato a Deus por isso… queremos exaltar o nome do Senhor Jesus por tudo que ele fez…

Jaime e Judith 2007